Os Três Rapazes - parte 4


 FÉLIX

 

         Passei a mão pelos cabelos. Não sabia ao certo o que responder.

         – Não me senti confortável.

         “Não é mentira.”

         Caio ajeitou seus óculos.

         – Acho que ninguém está muito confortável.

         “Idiota.”

         Luiz, o rapaz que ainda estava sentado ao meu lado, acho que sentindo a atmosfera ficar pesada (se é que poderia ficar mais), interviu:

         – Vocês se conhecem bem?

         – Fazemos a mesma faculdade. – Caio se apressou a responder. – Ele é meu veterano.

          – Então você estudava com a Ceci. 

          Luiz olhou para cima quando falou isso, diretamente em meus olhos. 

          Apenas concordei com a cabeça, sem dizer mais nada. Ele não seguiu a mesma linha.

         – Eu estudei com ela durante quase toda a minha vida. Na escola... quero dizer.

         Silêncio.

         Luiz:

         – Simplesmente não consigo acreditar que ela se foi.

         Caio chutou a grama. Então, veio o silêncio mais uma vez.

         Luiz:

         – É bizarro.

         Reprimi um bocejo. Não tinha dormido bem na noite anterior, ponderando se deveria ou não comparecer ao enterro de hoje.

         Mais silêncio.

         Mais Luiz:

         – Ela costumava ser muito alegre na época da escola.

         “Cala a boca, cara.”

         Eu tinha certeza de que o Caio se sentia da mesma forma que eu, pois estava fazendo menção de sair dali, mas Luiz abriu a boca novamente:

         – Como ela era na faculdade?

         – Profunda. – Meu calouro respondeu, quase num reflexo.

         “Profunda?”

         – Não é bem o que eu diria.

         – Então como você diria, Félix?

         “Eu falei aquilo alto? Merda.”

          O que eu mais queria era encerrar aquela conversa.

         – Eu diria solta. – Coloquei as mãos nos bolsos da calça. – Confortável e se deixando levar pelo fluxo.

         – Talvez no primeiro ano ela fosse mais assim, mas agora, mais perto do fim, estava cada vez mais retraída, mas, quando se envolvia de fato, era pravaler.

         É verdade que o Caio foi quem passou mais tempo com ela antes de morrer, pelo menos das pessoas da faculdade. Eles eram inseparáveis.

         Me senti irritado por um momento, ao perceber que ele estava certo, e que provavelmente teve mais dela do que eu. Deve tê-la tido de verdade, e não feito apenas o papel de uma válvula de escape.

         – Ela mudou muito neste último ano e pouquinho, então. -Luiz se incluiu na conversa.

         Os três sabiam bem o porquê, mas todos decidiram ficar quietos.

         O Caio passava uma atmosfera de garoto calmo, deixando as coisas acontecerem como bem entendessem.

         O que a Cecilass sempre quis: ser capaz de renunciar ao controle.

         Ele deve ter feito bem a ela.

          Voltei meu olhar para seu rosto: vermelho e inchado.

          “Agora se ela fez bem a ele... é outra história.”

          É verdade que, de todos nós, Luiz era o mais inchado e vermelho. Em seus trajes completamente negros, ele era o retrato do luto.

         Um cabelo muito bem penteado, um escapulário prateado e lábios aparentemente bem hidratados coroavam a imagem de bom menino. 

         Minha mistura de nojo e pena voltou.

         – Não me leve à mal. – Caio quebrou o silêncio. – Mas, eu não te conheço, e aparentemente o Félix também não, então por que você está aqui?

         Ele olhava para baixo, para o bom moço ainda sentado.

         Luiz balançou a cabeça e fungou.

         – Nem sei direito. Queria sair do olho do furacão, mas ainda não queria ir embora, e daqui consigo ver bem. – Ele apontou para a reunião de pessoas lá embaixo. – Estava tudo pesado demais lá, e eu ainda não estou pronto para dizer adeus. – Lágrimas começaram a brotar de seus olhos. – Para dizer adeus para a única garota que eu amei.

         “Amou?”

         A Cecilass chegou a falar que tinha tido um namorado antes de mim, um cara certinho e muito bom, amado pela família dela, que eu falei que devia ser um mané.

         Ali estava ele, sentado, afogado em mágoas e sem rumo.

         “Ele realmente parece um mané.”

         – Era mesmo a cara da garota ‘pré-Cecilass’ namorar um idiota desses.

         – Como é que é? – Luiz se levantou.

         Olhei para os olhos arregalados de Caio.

         “Eu falei isso alto?”

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